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    Quando um “profeta” erra em detalhes que qualquer manual de história corrige
    Ellen White

    Quando um “profeta” erra em detalhes que qualquer manual de história corrige

    Examine os erros históricos de Ellen White sobre o rei Jarebe e Nínive à luz das Escrituras. Descubra por que isso desafia o adventismo. Leia o artigo.

    31 de dezembro de 20257 min min de leituraPor Rodrigo Custódio

    Dois pontos específicos da literatura de Ellen White frequentemente passam despercebidos pela maioria dos adventistas, mas são devastadores para a pretensão de “inspiração profética”:

    • A identificação do misterioso “rei Jarebe” de Oséias com Senaqueribe, rei da Assíria.

    • A afirmação de que Nínive era “a capital do reino assírio” “nos dias de Israel dividido”.

    À primeira vista parecem detalhes técnicos; mas, quando confrontados com o texto bíblico, com a crítica textual moderna e com a assiriologia, ficam evidentes dois erros graves, que qualquer pesquisador com acesso a boas fontes consegue detectar.​


    Parte 1 – “Rei Jarebe” em Oséias: título honorífico, não Senaqueribe

    1.1 O texto de Oséias 5:13 e 10:6

    Na King James, Oséias 10:6 diz:

    “It shall be also carried unto Assyria for a present to king Jareb...”​

    A KJV assume que “Jareb” é um nome próprio, logo “rei Jarebe”. Já traduções modernas (NVI, etc.) vertem:

    “Será levada à Assíria como tributo ao grande rei...”​

    Por quê?

    • O hebraico massorético traz a sequência לְמֶלֶךְ יָרֵב (lemelek yarev), que pode ser repartida de outra forma, como לְמַלְכִּי רַב (lemalki rav = “ao meu grande rei”).

    • “Grande rei” é precisamente um título conhecido da monarquia assíria: šarru rabû, “o grande rei”.​

    Ou seja, o que muita exegese contemporânea enxerga aqui não é um nome próprio (“Jarebe”), mas um título honorífico: “o grande rei”, isto é, o rei da Assíria em sentido genérico, não um indivíduo nomeado como Senaqueribe ou Sargão.​

    1.2 O que Ellen White fez: de título genérico a identificação “profética”

    Ao comentar Oséias 8:5–6 e 10:5–6, Ellen White escreve em Profetas e Reis:

    “...Será também levada à Assíria, como presente ao rei Jarebe (Senaqueribe).”​

    Observe o movimento:

    • O texto bíblico é vago: “rei Jarebe” (ou “grande rei”).

    • A crítica textual moderna aponta para um título, não para um nome próprio.​

    • Ellen White intervém e especifica: esse rei é Senaqueribe.

    Isso é apresentado como se fosse um esclarecimento inspirado de uma figura obscura. A questão é: bate com a cronologia bíblico‑assíria?

    1.3 O problema cronológico: Israel já havia caído antes de Senaqueribe

    A profecia de Oséias diz que Israel buscaria ajuda do “rei Jarebe” (5:13) e que o bezerro idolátrico seria levado para a Assíria como tributo a esse rei (10:6).​

    Situação histórica:

    • O Reino do Norte (Israel) cai em 722 a.C., na transição entre Salmaneser V e Sargão II.

    • Senaqueribe começa a reinar posteriormente (c. 705–681 a.C.).​

    Conclusão:

    • Quando Senaqueribe assume o trono, Israel como reino já não existe.

    • Aplicar Oséias 5:13 (“Efraim viu a sua enfermidade, e Judá a sua chaga; Efraim se voltou para a Assíria, e Judá, ao rei Jarebe...”) a Senaqueribe implica Israel pedir socorro a um rei que só subiria ao trono depois de sua extinção política. Isso é cronologicamente impossível.​

    A leitura mais sólida é:

    • “Rei Jarebe” é título (“grande rei/rei vingador”), aplicado genericamente ao monarca assírio quando Israel ainda existia, muito provavelmente num contexto ligado a Tiglate-Pileser III, Pul, Salmaneser V ou Sargão II, todos cronologicamente coerentes.

    • Ellen White, ao escolher Senaqueribe, comete um erro histórico: erra o tipo de expressão (título x nome próprio) e erra na cronologia (põe Senaqueribe num cenário onde Israel ainda existe).​


    Parte 2 – Nínive e o status de capital: o que a arqueologia realmente diz

    2.1 A afirmação de Ellen White

    Em um artigo de 1913 na Review and Herald, Ellen White escreveu sobre Nínive:

    • Ela a descreve como cidade muito antiga, “fundada por ocasião da dispersão de Babel”.

    • Diz que era uma “cidade muito grande, de três dias de caminho” (alusão a Jonas 3:3).

    • E afirma que, “nos dias de Israel dividido”, Nínive “era a capital do reino assírio”.​

    Por “dias de Israel dividido”, o contexto indica o período:

    • Do cisma após Salomão (c. 931 a.C.),

    • Até a queda de Samaria (c. 722 a.C.).

    Pergunta: Nínive era, de fato, a capital da Assíria nesse intervalo?

    2.2 Capitais da Assíria entre 931 e 722 a.C.

    As fontes epigráficas e a síntese dos assiriólogos são claras: a capital mudou diversas vezes, e Nínive assume papel de capital plena apenas com Senaqueribe.​

    Sequência simplificada:

    • Assur – Capital tradicional até o século IX a.C.

    • Calá (Nimrud) – Transferência da capital sob Assurnasirpal II (c. 883–859 a.C.).​

    • Dur‑Sharrukin (Khorsabad) – Capital construída por Sargão II (r. 721–705 a.C.).​

    • Nínive – Elevada à capital imperial por Senaqueribe (r. 705–681 a.C.).​

    Ou seja:

    • Durante todo o período em que o Reino do Norte existiu (931–722 a.C.), as capitais oficiais foram Assur, depois Calá, e no final Dur‑Sharrukin.

    • Nínive só se torna capital oficial em 704/705 a.C., sob Senaqueribe, cerca de 15 anos após a queda de Samaria.

    2.3 Nínive nos dias de Jonas

    Há ainda a tentativa de “salvar” Ellen White argumentando que, como Jonas 3:6 fala do “rei de Nínive”, isso indicaria que Nínive já era capital.​

    Problemas:

    • “Rei de Nínive” pode muito bem designar governante local ou ser expressão literária, sem significar que a corte imperial inteira se trasladou para ali naquele momento.

    • A documentação assíria não apoia a ideia de Nínive como capital oficial no século IX ou início do VIII a.C.; ao contrário, aponta para Calá como sede da realeza nesse período.​

    Assim:

    • Nínive era, sim, uma cidade importante, religiosa, militar e administrativamente relevante.

    • Mas dizer que “nos dias de Israel dividido, era a capital do reino assírio” é anacronismo: antecipa uma condição que só se cumpre no tempo de Senaqueribe, após o fim político de Israel.​


    Parte 3 – Por que esses erros importam para a questão profética

    3.1 Não é apenas um detalhe técnico

    Muitos adventistas reagem dizendo: “isso são detalhes de história antiga, sem relevância espiritual”. O problema é que:

    • Ellen White não se limitou a relatar impressões devocionais gerais; ela afirmou identificar o rei de Oséias (“rei Jarebe”) com um nome específico (Senaqueribe), como se estivesse esclarecendo algo obscuro da Escritura.​

    • Ela também fez uma afirmação histórica objetiva sobre a condição de Nínive como capital durante determinado período (“nos dias de Israel dividido”).​

    Em ambos os casos:

    • A Bíblia não exige essas especificações; ela deixa os dados abertos ou genéricos.​

    • A pesquisa histórica e linguística mais sólida mostra que essas especificações estão erradas.​

    Isso significa que, quando Ellen White vai além do texto bíblico e entra no terreno de detalhes históricos, ela não demonstra nenhum privilégio profético de acerto, ao contrário, é corrigida pela erudição.

    3.2 Tensão com a reivindicação de “luz especial”

    Para alguém apresentado como:

    • “mensageira do Senhor”;

    • “portadora de luz adicional para o remanescente”;

    • “intérprete autorizada da Escritura”,

    ser incapaz de:

    • distinguir corretamente um título de um nome próprio em Oséias,

    • e localizar corretamente o status de capital de Nínive no mapa cronológico assírio,

    é problemático.​

    Se em campos que podem ser verificados — história, cronologia, geografia — ela falha justamente quando “revela” detalhes que a Bíblia não revela, que confiança se pode ter nas “revelações” que não podem ser checadas externamente?


    Parte 4 – O que um adventista sincero precisa encarar

    Diante dos dados:

    • “Rei Jarebe” em Oséias 5:13 e 10:6 é melhor entendido como título (“meu grande rei / o grande rei”) aplicado genericamente ao soberano assírio, não como um nome próprio que se deva identificar com Senaqueribe.​

    • Nínive não era capital oficial da Assíria “nos dias de Israel dividido”; ela só assume esse papel sob Senaqueribe, depois de 705 a.C., isto é, depois que Israel (Reino do Norte) já havia sido destruído.​

    • Ellen White, em ambos os casos, vai além do texto bíblico e produz afirmações históricas em desacordo com o quadro factual reconstruído por arqueologia, epigrafia e crítica textual.​

    Isso leva a questões inevitáveis:

    • Se ela não é confiável em detalhes concretos de história bíblica, por que deveria ser considerada autoridade “inspirada” em doutrinas que não podem ser testadas externamente (como selos, marcas, juízo investigativo, etc.)?

    • Se cada vez que a erudição avança, novas correções a ela precisam ser feitas, não seria mais honesto reconhecer que ela foi uma autora devocional do século XIX, sujeita aos erros do seu tempo, em vez de insistir num status profético que os fatos não sustentam?

    Para quem busca fidelidade à Escritura, a lição é clara:

    • A Bíblia permanece o padrão normativo.

    • Qualquer voz que se apresente como profética e se mostre falível justamente onde pode ser verificada não pode ser colocada ao lado da revelação bíblica.

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